Primeiro Brasão
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Do primeiro brasão de armas do município de Americana pouco se pode encontrar. Clovis Ribeiro, em seu conhecido livro "Brasões e Bandeiras do Brasil", registra na página 233 a ilustração, entre outras, das armas de Americana, em monocromia, mas trazendo a indicação dos esmaltes, segundo a convenção idealizada pelo Padre Silvestre Pietra Sancta, assinalando, contudo, no final da página 254, não ter obtido informações sobre alguns brasões de armas de municípios paulistas incluindo, entre estes, o de Villa Americana. Como a obra foi publicada em 1933, é óbvio que àquela data o referido estema já vinha sendo utilizado pelo município. Em nossos arquivos, temos o registro de informação datada de 11 de junho de 1963 e prestada pelo senhor Fausto Mantovani, então Chefe do Serviço de Administração da Municipalidade de Americana, segundo a qual o brasão de armas municipal, até àquela data, ainda não havia sido oficializado. Desta forma, somente uma pesquisa nos documentos antigos da Prefeitura e da Câmara Municipal de Americana, assim como nos arquivos de "documentos recebidos" de órgãos estaduais e de municípios vizinhos, poderão propiciar o conhecimento da data aproximada em que Americana passou a fazer uso de seu primeiro brasão de armas, sem embargo das revelações inesperadas que os anais da Câmara Municipal possam trazer. Das poucas fontes de consulta a que tivemos acesso, entretanto, pudemos tirar algumas conclusões - que adiante arrolamos - a serem comparadas com o que ulteriores pesquisas procedidas no município de Americana trouxerem a lume. As primeiras armas de americana foram ordenadas por quem tinha noções de heráldica, ainda que não de todo sólidas, o que se pode deduzir da escolha de um escudo como componente principal do brasão de armas. O estilo do escudo escolhido foi, aproximadamente, o denominado samnítico, ou francês moderno, criado pelo heraldista francês Hierosme de Bara, em fins de século XVI. Enfatizamos tratar-se de mera aproximação, em virtude de não terem sido obedecidas as proporções consagradas, já que o modelo do escudo samnítico deve atender a uma altura igual à largura, acrescida de um sétimo, enquanto que nas armas de Americana a altura é bem maior, correspondendo, grosso modo, à largura acrescida da metade. A escolha de um escudo como motivo central, encimado de coroa crenelada, com suportes e listel, no qual se inscreve a divisa "Ex Labore Dulcedo", demonstram que o autor do primeiro estema americanense possuía algumas noções de heráldica, conquanto a deformação do escudo e a coroa crenelada em lugar da mural, assim como a posição dos suportes, estão também a demonstrar que essas noções vinham a ser superficiais. O escudo do primeiro brasão de armas de Americana é cortado, isto é, dividido ao meio horizontalmente, tendo-se como conseqüência, dois quartéis e, portanto, dois "campos". O primeiro quartel do cortado, isto é, o que se situa na metade superior do escudo, já proporciona matéria para algumas dúvidas. Uma fotografia do brasão de armas originária da municipalidade de Americana traz o primeiro quartel todo branco, com uma colmeia também branca, guarnecida de amarelo e ornada de sable (preto), acompanhada de um enxame de abelhas de amarelo. Tal composição estaria a indicar que o primeiro quartel seria de prata, com uma colmeia também de prata, ornamentada de ouro e de preto. As abelhas também seriam de ouro. Ora, teríamos, no caso, grosseira desobediência à regra básica da heráldica, segundo a qual não se coloca metal sobre metal, ou cor sobre cor, ou pele sobre pelo e, partindo-se do princípio de que o autor das armas de Americana dispunha de noções de heráldica, convenhamos que dificilmente poderíamos aceitar que tivesse perpetrado tal absurdo. Em abono deste entendimento, temos que na ilustração do livro de Clovis Ribeiro a que já fizemos menção, o primeiro quartel vem marcado por linhas paralelas postas em banda, isto é, diagonais de dextra para sinistra do escudo (correspondendo a da esquerda para a direita do espectador), indicando, na representação dos esmaltes, segundo Pietra Sancta, a cor sinople, ou seja, verde. A colmeia e as abelhas, de metal, estariam em campo de cor, e pois, obedientes à regra básica a que aludimos e constituiria mais provavelmente o que foi efetivamente projetado para o primeiro quartel das primeiras armas de Americana. Os exemplares das armas de Americana, contudo, que nos chegaram às mãos, retiradas de folhas de papel timbrado do município, não trazem a indicação da cor verde. O exame da documentação mais antiga de Americana, timbrada com seu primeiro brasão de armas, certamente fornecerá a chave deste pequeno mistério. Desse primeiro quartel pode-se dizer ainda que traz figuras heráldicas das mais adequadas, já que a abelha é o símbolo do trabalho em heráldica. Este símbolo, completado pela divisa "Ex Labore Dulcedo", demonstra claramente que a abelha foi escolhida com o objetivo predeterminado de caracterizar Americana como município no qual o trabalho ocupa a principal atenção. Assinale-se que tal simbolismo, por representar corretamente o espírito do povo de Americana, foi mantido nos dois (agora, três) posteriores brasões de armas do município: tanto a colmeia e as abelhas, como a divisa. O segundo quartel é de prata, com quatro faixas de sable (preto) e está flagrantemente se referindo à Bandeira Paulista. O escudo, como anteriormente observado, é encimado de coroa crenelada, que difere da coroa mural, característica dos municípios, por não ter torres. A escolha da coroa crenelada se deve, ou ao pouco conhecimento do autor das armas primeiras de Americana das regras de heráldica, ou à deformação introduzida pelas sucessivas reproduções do brasão de armas, para a feitura dos clichês destinados a timbrar a documentação oficial. Os exemplares a serem encontrados em nossos arquivos das primeiras armas de Americana, trazem todos a coroa crenelada de oito merlões mas, a sempre referida ilustração do livro de Clovis Ribeiro, traz o escudo encimado de coroa mural de quatro torres (três aparentes). A coroa mural já vinha sendo usada na armaria cívica paulista desde a adoção das armas de Campinas, em dezembro de 1889, cujo escudo é encimado de coroa mural de quatro torres. Também em novembro de 1924, quando se deu a emancipação de Americana, já haviam sido instituídos os brasões de armas de Porto Feliz e Itu, ambos com coroas murais de quatro torres. Ainda neste passo, uma peregrinação pelos documentos antigos do município de Americana poderia revelar as características originais da coroa que figura em suas armas. Os ornatos externos, por derradeiro, estão a indicar as riquezas da terra: o ramo de cafeeiro, à dextra, e o de algodoeiro, à sinistra. Este, referente às culturas de algodão trazidas pelos colonizadores norte-americanos, advindos dos estados do Sul de seu país ao reflexo da Guerra de Secessão, onde o algodão era forte lastro econômico. Eis o que pode ser dito sobre o primeiro brasão de armas de americana, à luz das fontes a que tivemos acesso. Caberá ao pesquisador local, perlustrando documentos a partir da emancipação de Americana, constatar a época em que o símbolo municipal principiou a ser utilizado, as variações do desenho e, até mesmo, fazer aflorar o nome do seu autor e o memorial descritivo.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO 28 de Dezembro de 1993